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Terça-feira, 13 de Maio de 2025

Geral

Enquanto o ensaio fluía, frustrado internamente, ele chorou o choro da verdade

Aquela gente juvenil se junta para sorver a história dos antepassados

Mário Terres - Tradicionalismo
Por Mário Terres -...
Enquanto o ensaio fluía, frustrado internamente, ele chorou o choro da verdade
Pedro Molnar
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Era uma noite tranquila e de hábitos costumeiros. O ar, um tanto morno, sorvia ventos de primavera que carregam o cio das flores e traziam um céu negro estrelado com a lua de pingente. Tudo tranquilo como deve ser. Aquela gente de idade juvenil, se junta toda a quinta feira em um galpão para sorver a história de seus antepassados, que chamam de tradição. Por isso o nome Danças Tradicionais, e eles entendem sua responsabilidade para com esse legado.

Essa reunião, chamam de ensaio, típico de quem aprende e ensina, confraterniza e abraça a causa, uns dos outros, somando energias boas aos atos exercidos por pessoas igualmente boas. Saias que se balançam em sarandeios contidos e delicados, pés que batem no tablado ritmadamente em pura habilidade, mãos que se juntam e corpos que se saúdam respeitosamente, pois assim é o ambiente, leve, fino, ritmado e respeitoso. Não era uma dança fácil, mas o empenho era completo e pleno, aos poucos iam absorvendo e ajudando, numa cumplicidade de família, onde irmão comungam da mesma alegria e sangram a mesma dor. Bailavam os jovens como se estivessem em um galpão entre mil setecentos e tantos e mil oitocentos e pouco, de forma simples, recatada e alegre, sempre com muita reciprocidade.

Então vem a dificuldade, e com ela a ânsia incontida de acertar, de fazer o melhor, dando vazão ao dançar antigo. Labuta, entrega, suor... Não obstante um dos irmãos daquela família inquieta se ausenta, some no tempo e põe um que de ansiedade em todos os outros. Onde andaria aquele posteiro melenudo de boa fala e olhos de quem se embriaga de dança e viaja no tempo ao conduzir o seu grupo? Por onde se foi o vivente que alegra e apoia seus irmãos de causa?

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Foi chorar o seu choro copioso de quem não se permite errar, foi descarregar suas angústias das cacimbas dos olhos para o universo, aturdido de tantas penas, que a falha com seus semelhantes, de não conseguir, mesmo dando o melhor de si, aprender eximiamente para conseguir ensinar. Foi derramar o sal dos olhos escondido, para que esses mesmos irmão, não sofressem a dor que ele escolheu sofrer sozinho, as dores que o coração e a mente acumulam e que só a cascata do peito derrama de forma úmida, tentando aliviar a pressão da alma. Só ele esqueceu que ali não se formam campeões, ali não é o lugar de grandes gladiadores, ali não se reúnem todas as quintas feiras para cobiçarem um troféu que serve para encher as estantes e esvaziar os corações. Ali é o lugar que a dança é fio condutor para o desenvolvimento da amizade, o fortalecimento da família, o treinamento da humildade e aperfeiçoamento da gratidão. Ali não sou eu, nem tu, são sempre “nós”, porque família se faz de mãos dadas e corações conectados. Essa gente que ele escolheu abraçar ser abraçado, notou a falta do seu irmão, solidarizou com a necessidade de sua presença e foi, de forma silenciosa, busca-lo para que voltasse a ocupar o seu lugar naquele círculo de bondade.

Ele instintivamente negou, e negando prostrou-se escondido entre o emaranhado de seu cabelo, ali bem no canto, longe do meio do salão, onde as tábuas e o cimento se unem para compor o todo, ficou distante dos seus iguais, escondido em sua prisão moral de autoflagelo. Porque se cobrar tanto? Porque ele entende que somos interdependentes nessa caminhada e não quer ser, jamais, um fardo para aqueles que tem como irmãos. Só ele não contava que estariam todos imbuídos em tantas causas, que a menor delas era a que lhe incomodava. Estão firmes na causa da dança, mas enlaçados na causa do amor, que nada vale mais para todos eles que a amizade, que a felicidade dos seus iguais. Principalmente porque eles entendem o significado de “iguais”.

Em um ato coordenado de voz uníssona, chamaram-no para o abraço fraterno, chamaram-no para o lugar onde deveria ter ficado desde o início e nem sequer arredado o pé, para o círculo da felicidade. Ele se negou. Não por rebelde, nem porque ignorava seus iguais, mas porque a frustração e indignação solitária lhe causava um torpor, que nem as pernas, nem os olhos queriam ir em direção ao círculo, por mais que aquilo lhe estava rasgando o coração. E num ato heroico, corajoso e fraterno, já que ele decidiu prostrar-se, todos foram ao seu encontro, num abraço que não tem palavras, mas diz muito mais que esse texto e tantos outros. Ali se formou o circulo mágico do amor, da fraternidade e da bondade, provando que em cada CTG podemos apenas dançar e buscar premiações, ou estabelecer vínculos que o tempo jamais romperá.

E ele foi embora com os olhos marejados e o coração inflado de afeto e amizade, afinal ele não em nenhum troféu para as suas estantes, mas muitos irmãos para seu coração gerando luz infinda em sua alma.



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