Em sessão remota da última quarta-feira, 24/06/2020, o Senado aprovou o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, através do Projeto de Lei - PL Nº4162/2019. O projeto é de iniciativa do governo federal, foi aprovado em dezembro do ano passado na Câmara dos Deputados e agora segue para a sanção presidencial. A matéria baseia-se na Medida Provisória – MP Nº 868/2018, a qual perdeu sua validade por não ter a devida apreciação completada no Congresso Nacional em 2019. Assim, o governo enviou ao Legislativo um novo projeto com o mesmo tema.
O texto conta com a prorrogação do prazo para o fim dos lixões, facilitação da privatização de estatais do setor e extinção do modelo atual de contrato entre municípios e empresas estaduais de água e esgoto. Pelas novas regras, as companhias precisarão obedecer a critérios de prestação, tarifação, legislações ambientais e técnicas, mas podem atuar sem concorrência. O novo marco transforma os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que vier a assumir a estatal. O texto também torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas.
Apesar de não haver alterações na essência do texto aprovado, o tema gera polêmica sobre os impactos que a nova lei poderá gerar no bolso do contribuinte, na geração de empregos, na qualidade do serviço, entre outras questões.
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Desde a Constituição de 1988 e com o advento da Lei Nº 11445/2007, a qual definiu que a titularidade da administração dos serviços de água e esgoto é dos municípios, as prefeituras podiam criar suas próprias estatais ou autarquias para prestar o serviço ou contratar empresas privadas ou estaduais, firmando contratos de programas com empresa estatal sem licitação, porém também poderia conceder serviços para uma empresa privada licitada. E com o advento do PL Nº4162/2019, a ANA – Agência Nacional das Águas passará a ser a responsável pelo setor e abrangerá abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos e drenagem – hoje, isso também é responsabilidade de estados e municípios.
Também se somaria à principal atribuição da autarquia a regularização do uso das águas dos rios e lagos de domínio da União e gerenciar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH), junto a órgãos de estados e municípios. Reforçando que a autarquia não vai assumir a regulação direta do saneamento, ou seja, as agências já existentes, incluindo as estaduais e Comitês de Bacias Hidrográficas, continuarão a regular as operações das empresas sob suas competências, mas ao emitir as normas de referência e padronizar os serviços, pode contribuir para reduzir os custos ao cidadão. Na prática, isso significa que vai designar normas gerais para o serviço no país, além de oferecer apoio técnico a estados e municípios no planejamento e execução dos serviços prestados à população. As normas servirão de parâmetro para as empresas, públicas ou privadas, que terão apoio para formar um corpo técnico qualificado.
É importante salientar que o novo marco do saneamento não privatiza a água!
Conforme dados da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Água e Esgoto (Abcon), atualmente cerca de 70% dos brasileiros são atendidos por empresas públicas estaduais. As municipais atendem 22% da população e os outros 6% estão com a iniciativa privada. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), mais de 16% da população brasileira ainda não tem acesso ao abastecimento de água, o que equivale a mais de 35 milhões de cidadãos, três vezes mais que a população de Portugal, por exemplo. Mais de 100 milhões de pessoas também não contam com cobertura de coleta de esgoto, ou seja, somente 46% do volume total é tratado no Brasil, de forma que os outro 54% são descartados diretamente no solo ou em rios, lagos e mar diretamente, gerando uma poluição descomunal, com impactos visíveis e desagradáveis.
O Instituto Trata Brasil compilou dados brasileiros em um relatório divulgado em Março/2020 e apontou que os avanços até o momento ainda são insuficientes para que o país cumpra compromissos nacionais e internacionais em água tratada, coleta e tratamento de esgoto até 2030. Além desse compromisso com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, há a promessa interna de atingir a universalização dos serviços até 2033, em estimativa prevista no PLANSAB - Plano Nacional de Saneamento Básico. Para que isso ocorra, o país precisaria investir mais de R$ 350 bilhões até 2033 – ou R$ 23,8 bi por ano para alcançar a ampla cobertura do setor. As 20 melhores cidades no ranking do saneamento investiram, por ano, cerca de R$ 133 por habitante entre 2014 e 2018. Já as 20 piores investiram anualmente menos de R$ 30 por habitante – bem abaixo da média nacional R$ 114, considerada mínima para a universalização dos serviços. Atualmente, Porto Alegre aparece como o 40º município no ranking e apesar de Guaíba não estar citada, sabemos que os investimentos foram menores que essa ordem.
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A tarifa é outra preocupação do cidadão, que é uma realidade de cada município e deve ser definida pelo poder público, através de planejamento econômico, financeiro, ambiental e social, juntamente com agências de regulação e Conselhos Municipais de Saneamento. Quem é “dono” do serviço é o município e como todo serviço público, tem instâncias de controle social e pressão popular.
Assim, caberá ao poder público incentivar a iniciativa da empresa licitada ou concessionária a investir inclusive nas periferias e nos municípios pequenos. Um ponto positivo pelo lado ambiental e de engenharia é que deverá ser empregado o compartilhamento de recursos naturais e financeiros incluindo a despoluição e revitalização de locais naturais e protegidos por leis para servir às populações. Será de difícil prática, mas não impossível. Além disso, no setor se prevê um incremento de cerca de 1 milhão de empregos formais e técnicos.
E por falar em para Guaíba, o que influenciará o novo marco regulatório do saneamento?
A Prefeitura Municipal terá um papel fundamental pois deverá decidir se optará pelo serviço atual da CORSAN ou se abrirá processo licitatório. Depois deverá ser formado o Conselho Municipal de Saneamento Básico, no qual a sociedade civil organizada se insere e decisões importantes deverão ser tomadas.
Pelo atual modelo e planos, acredito que a CORSAN continue responsável pelo setor no município até 2035, se não for privatizada pelo governo estadual. Entretanto os recursos são escassos, advindos do governo estadual e com poucas iniciativas da Prefeitura de trazê-los via governo federal. Isso é preocupante e revoltante quando vejo (e serei repetitiva) a falta de interesse na própria regularização do saneamento, visto a cultura do “cano enterrado não dá voto”, assim como a condição de nosso patrimônio ambiental – o Arroio Passo Fundo e a situação da população circunvizinha, tantas vezes relatadas por essa colunista, inclusive em outros meios de comunicação.
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Conforme dados oficiais do Plano Municipal de Saneamento Básico de Guaíba/2014 e segundo dados do censo de 2010 do IBGE, Guaíba conta com população total de 94.343 habitantes, os quais somente 69.775 moradores tem suas casas ligadas a rede geral de esgoto ou ligadas diretamente na coleta de água pluvial. Isso significa que 73,68% da população teria esgotamento sanitário, por esses números. Ocorre que na prática isso é um dado equivocado, porque os dados de rede geral de esgoto deveriam ser analisados separadamente da coleta de água pluvial, logo os números corretos são menores.
Comunidade Guaibense: as eleições batem às nossas portas e os pré-candidatos já se mostram nas redes sociais. Nesse momento se faz necessária uma reflexão principalmente quanto ao que já foi feito e em tudo o que Guaíba ainda tem para avançar em termos de saneamento básico. Sugiro a leitura três Planos Municipais, que se faz necessária antes de comentários sem conhecimento: 1. Plano Diretor; 2. Saneamento Básico; 3. Meio Ambiente. Já li todos e afirmo que falta muita informação, há dados equivocados e para serem colocados em prática, são necessárias atualizações urgentes. Aí te pergunto: Você está satisfeito com o serviço de Saneamento Básico de nosso município? Como representante da comunidade em vários conselhos municipais, muitas vezes voto vencido na luta pelo cumprimento das leis, defesa e proteção à comunidade, minha resposta é óbvia: Eu não!
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